Uma notícia está abalando a
imprensa e a sociedade. É o caso da dona de casa Fabiane Maria de Jesus
linchada e morta pela histeria coletiva de moradores de uma comunidade de
Guarujá-SP. Ela foi vítima, até então, de um boato de extrema má-fé que
afirmava ser ela uma sequestradora de crianças para praticar atos de bruxaria e
feitiçaria.
Os vídeos que circulam pela
internet demonstram uma espécie de ‘’tribunal popular’’ emotivo e irracional. Em
um vídeo publicado pelo portal G1¹, os ‘’justiceiros’’ interrogam a vítima depois
de ter sido violentamente espancada e estar com o rosto irreconhecível – como se
alguém tivesse condições de responder a alguma coisa depois de tanta agressão
física.
O italiano Gaetano Mosca já nos
alertava do ‘’perigo’’ que as massas poderiam causar, justamente por seu
caráter emotivo e irracional. Na percepção desse autor, o indivíduo pode vim a
perder sua racionalidade quando se encontra em um coletivo. Mas o caso em
questão não é só simplesmente assunto de irracionalidade coletiva ou emotiva, a
acusação à vítima de que ela praticava atos de bruxaria e feitiçaria diz muito
a respeito dos agressores.
Diz muito sobre os agressores
porque esse caso consternador nos demonstra a erupção da intolerância que cada
vez mais impera em nossa sociedade. O quanto a acusação de bruxaria e
feitiçaria legitimou – para os agressores, a criação espontânea de um ‘’tribunal
popular’’ e o espancamento que ocasionou a morte da vítima?
Tem-se um imaginário popular acerca da feitiçaria e da bruxaria no Brasil, e diferentemente da relativa tolerância entre as várias religiões cristãs que existem no Brasil, os atos pagãos são incrivelmente intoleráveis. O limite da tolerância de culto no Brasil é a fronteira entre ser cristão ou pagão, ainda que não resulte em violência física. Obviamente que só a acusação de bruxaria e feitiçaria não implicaria no espancamento da vítima, pois um só fator não pode explicar uma forma de crueldade tão complexa. O limite da fronteira cristã como forma do binômio tolerância/intolerância é só um contorno e não é de maneira alguma, uma crítica aos religiosos, como se verá durante este texto.
Tem-se um imaginário popular acerca da feitiçaria e da bruxaria no Brasil, e diferentemente da relativa tolerância entre as várias religiões cristãs que existem no Brasil, os atos pagãos são incrivelmente intoleráveis. O limite da tolerância de culto no Brasil é a fronteira entre ser cristão ou pagão, ainda que não resulte em violência física. Obviamente que só a acusação de bruxaria e feitiçaria não implicaria no espancamento da vítima, pois um só fator não pode explicar uma forma de crueldade tão complexa. O limite da fronteira cristã como forma do binômio tolerância/intolerância é só um contorno e não é de maneira alguma, uma crítica aos religiosos, como se verá durante este texto.
A questão da tolerância é fundamental
para entendermos estes casos específicos. E o quanto a sociedade brasileira é
tolerante? Um olhar de um observador mais descuidado poderia afirmar taxativamente
que o Brasil comporta uma tolerância enorme: haja vista sua pluralidade
cultural, religiosa... Mas será mesmo uma sociedade tolerante?
Historicamente, o Brasil pode ser visto pela ótica da intolerância contra determinados grupos e em determinadas épocas, tais como a repressão a Revolta da Vacina e a Guerra de Canudos. A repressão se deu a este e a aquele com o argumento legitimador da civilização, em outras palavras: seres incivilizados devem ser reprimidos. Não só nós brasileiros temos certo grau de intolerância. A sociedade ocidental europeia – apesar de seus avanços irrenunciáveis, é marcada quantas vezes pelo extermínio do outro pelo simples fato de o ser pagão e praticar ritos e cultos diferentes dos cristãos? Ora, a intolerância é uma das heranças que recebemos do mundo ocidental europeu, acontece que nós a redesenhamos sem romper totalmente com os traços originais.
Historicamente, o Brasil pode ser visto pela ótica da intolerância contra determinados grupos e em determinadas épocas, tais como a repressão a Revolta da Vacina e a Guerra de Canudos. A repressão se deu a este e a aquele com o argumento legitimador da civilização, em outras palavras: seres incivilizados devem ser reprimidos. Não só nós brasileiros temos certo grau de intolerância. A sociedade ocidental europeia – apesar de seus avanços irrenunciáveis, é marcada quantas vezes pelo extermínio do outro pelo simples fato de o ser pagão e praticar ritos e cultos diferentes dos cristãos? Ora, a intolerância é uma das heranças que recebemos do mundo ocidental europeu, acontece que nós a redesenhamos sem romper totalmente com os traços originais.
Disponível em : https://www.facebook.com/photo.php?fbid=593213967403032&set=a.605338819523880.1073741832.217022305022202&type=1&theater
Os acontecimentos atuais de ‘’justiça
popular’’ são dados da realidade que nos mostram o grau de intolerância em
nossa sociedade. Uma triste continuidade! O espancamento de Fabiane que
resultou em morte pode nos relegar um triste fardo social que vem ocorrendo: o
desprezo pela dignidade humana, esta que por sua vez está diretamente ligado à
tolerância. Se o espancamento de Fabiane não foi principalmente por ela ser
acusada de ser bruxa e feiticeira, estas acusações foram o pano de fundo
explicativo para a extrema violência a qual nossa tradição intolerante permitiu
que isto ocorresse e que continuará permitindo.
No atual cenário brasileiro, a ignorância alimentada pelo medo tem criado, aos poucos, um barril que se enche a cada dia de ódio. Essa combinação explosiva vem possibilitando o uso recorrente da violência, esta não mais centralizada nos órgãos estatais ou naqueles que tradicionalmente aplicam violência – os bandidos. A violência, assim como a nossa sociedade atual, é descentralizada. O cenário de caos provocado pela ausência do Estado em questões fundamentais, tais como a segurança pública tem alimentado a fórmula que gera o ódio: medo, insegurança e ignorância. E o ódio em uma sociedade que carrega fortes traços de intolerância é o combustível que faz explodir as ações de justiça privada, que se caracteriza pela punição física sem o devido processo legal (julgamento). E mais dramático ainda é o quanto nossa sociedade está incorporando o discurso de desprezo pela presunção de inocência, conquista liberal que deve ser irrenunciável a um país que pretende ser justo e tolerante.
No atual cenário brasileiro, a ignorância alimentada pelo medo tem criado, aos poucos, um barril que se enche a cada dia de ódio. Essa combinação explosiva vem possibilitando o uso recorrente da violência, esta não mais centralizada nos órgãos estatais ou naqueles que tradicionalmente aplicam violência – os bandidos. A violência, assim como a nossa sociedade atual, é descentralizada. O cenário de caos provocado pela ausência do Estado em questões fundamentais, tais como a segurança pública tem alimentado a fórmula que gera o ódio: medo, insegurança e ignorância. E o ódio em uma sociedade que carrega fortes traços de intolerância é o combustível que faz explodir as ações de justiça privada, que se caracteriza pela punição física sem o devido processo legal (julgamento). E mais dramático ainda é o quanto nossa sociedade está incorporando o discurso de desprezo pela presunção de inocência, conquista liberal que deve ser irrenunciável a um país que pretende ser justo e tolerante.
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